Relatório estima que o mercado de alimentos on-line deverá triplicar no mundo até 2025
A disparada na venda on-line dos supermercados fez crescer o peso desse canal nas vendas totais das empresas pelo mundo, inclusive no Brasil, mas isso joga luz sobre duas questões sensíveis: o efeito nas margens de lucro e o risco de canibalização da loja.
O assunto foi tema de relatório de 27 páginas da equipe de analistas do Credit Suisse em diferentes países e finalizado poucos dias atrás. O relatório estima que o mercado de alimentos on-line deverá triplicar no mundo até 2025, atingindo US$ 1,2 trilhão.
A lucratividade é pressionada pela venda no comércio eletrônico porque, nesse canal de alta competição e custos não desprezíveis, as margens são sempre menores que nas lojas. Sobre a canibalização, ela fica mais clara, por exemplo, quando a rede parece crescer muito nos vendas do digital, mas a receita total não avança, sinal de que o que há é só migração da venda das lojas para o site.
Segundo a equipe de análise, a adoção mais rápida do modelo de venda on-line nas redes de supermercados pelo mundo, após a pandemia, reduziu as margens de lucro das empresas, pela pressão do aumento de despesas sobre as empresas.
Mesmo grandes redes, como Tesco e Sainsbury, que lideram o mercado britânico, relatam margens de lucro estáveis, apesar da aceleração nas vendas on-line após a covid-19, dizem eles.
A equipe vê aumentos de custos significativos, na área de mercearia on-line, especialmente no trabalho de coleta das mercadorias nas lojas para o cliente e na entrega manual, que cresceram nos últimos meses. O banco faz alertas, diz que “a coleta é ineficiente, pois causa superlotação nas lojas”, ao utilizar funcionários para o serviço e por ter volume maior de empregados circulando pelos corredores e caixas.
Apesar de muitos varejistas oferecerem entrega gratuita para se manter competitivos, a equipe disse que a diretoria da Fabric, site de venda on-line da Amazon, estima que a separação custe cerca de 12 a 14 euros por pedido (R$ 70 a R$ 80), enquanto a consultora Brittain Ladd acredita que varie de US$ 7 a US$ 11 (R$ 37 a R$ 58).
Ainda mencionam maiores despesas de marketing para atrair consumidores on-line, apesar da queda no uso desses recursos após março, por causa da demanda mais acelerada. Como o tráfego nas lojas já estava crescendo, essas ações para atrais público (vouchers, frete reduzido) foram reduzidas drasticamente.
Mas as estratégias comerciais estariam voltando a ganhar terreno com a normalização gradual da demanda.
Fazem parte do time de analistas da área de varejo alimentar do Credit Suisse Victoria Petrova, Onur Muminoglu, Rob Moskow, Victor Saragiotto (no Brasil) e A-hyung Cho.
Ações de defesa
Para tentar lidar com as pressões nas margens, o relatório menciona ações em prática no varejo. Fala em entregas feitas nas próprias lojas, sem o motorista precisar descer do carro. Com isso, a rede não precisa mandar uma funcionário até a casa do cliente.
Menciona a separação de pedidos de forma automatizada (braços de separação robóticos e centros de atendimento automatizados), o que aumenta a eficiência e reduz os custos de coleta, mas requer um alto custo inicial das redes, aumentando os investimentos (Capex).
Incentivos para o cliente fazer compras maiores, diluindo para a rede o custo do frete e, com isso, fazer maior volume de entregas em uma mesma região, também é outro ponto citado.
Uma questão mais complexa, porque envolve aspectos estratégicos e de posicionamento das redes, é a possibilidade de as empresas praticarem “preços mais racionais para refletir com precisão o custo de entrega”.
O ponto é que, em setores historicamente com alta competição, e já caminhando para uma maior normalidade no pós-covid, elevar preços pode ter efeito direto na demanda. Isso porque o custo final da transação ainda é fator de escolha da rede na hora da compra.
O Credit Suisse projeta que o mercado de alimentos on-line deve crescer de cerca de US$ 402,6 bilhões em 2019 para US $ 1,2 trilhão em 2025. Não há projeção para 2020. Isso significa que em 2019, a penetração on-line era de 4,4%, e deve dobrar em 2025, para 8,8%.
No Brasil, Grupo Pão de Açúcar (GPA) e Carrefour já sentiram aumentos consideráveis nessa venda, disseram a analistas semanas atrás.
O GPA, dono do Assaí, Extra e Pão de Açúcar, disse em julho que as vendas on-line do segundo trimestre foram 3,7 vezes maiores que um ano atrás e representam 5,6% das vendas alimentares do varejo. na bandeira Pão de Açúcar, equivaleram a 15,3% das vendas. No gupo colombiano Exito, controlado pelo GPA, representou cerca de 12% das vendas.
Aos analistas, a companhia afirmou que estava montando um “marketplace” (shopping virtual com diferentes lojistas) para lançamento neste ano, e estima que o canal on-line atinja R$ 1 bilhão em vendas em 2020 (quase 3 vezes a mais que 2019), impulsionado pelo aumento de sua capacidade operacional.
No Carrefour Brasil, o percentual do alimentar on-line na venda total foi de 7,7% em junho (era 2,5% em janeiro). Em São Paulo, atingiu 14%.
A equipe do Credit Suisse ainda estima que o mercado de alimentos on-line movimentou US$ 186 bilhões em 2019, chegando a US$ 850 bilhões em 2025, com impacto das mudanças de hábito do consumidor no pós-covid.
A penetração da mercearia on-line no mercado de alimentos crescerá de 2% em 2019 para 6% em 2025.
O portfólio completo de produtos e preços ainda são fatores de escolha do local de compra, reforça a pesquisa. “Os consumidores preferem métodos de retira em loja [especialmente em mercados desenvolvidos] e esperam uma entrega mais rápida em menos de uma hora. Mas esse diferencial, porém, não é o suficiente para justificar diferenças de custo no valor do frete”.
Outro ponto de destaque do relatório após a pandemia é o risco de canibalização da venda on-line sobre as lojas físicas da própria varejista. Isso ocorre quando a rede “perde” venda para ela mesma — o cliente só troca de canal, saindo da loja e indo comprar no site. A cadeia não consegue crescer a receita de todo o negócio, apesar de reportar altos números de crescimento on-line.
“A Tesco, que tem a maior participação de mercado no Reino Unido, provavelmente verá mais vendas canibalizadas à medida que os clientes migrarem para o on-line”, diz a equipe.
No Brasil, o Carrefour disse a analistas em julho que 60% das vendas on-line vem de novos clientes, e 70% deles são totalmente novos para os hipermercados também, num sinal de que parte dos consumidores não vem da mesma base de clientes já da loja física.
Outra constatação é que o futuro do on-line é um modelo “leve” em termos de investimentos (capex). “A maioria dos especialistas com quem falamos concorda com a necessidade de um capex ‘light’ em termos de estratégias de desenvolvimento on-line para supermercados”, diz.
Fonte: Valor INVESTE