Sabemos que hoje no Brasil, empreender definitivamente não é para amadores, em especial, aos empreendimentos do setor Supermercadista. Pois, além de todos os desafios na condução do negócio, como a obtenção das licenças de funcionamento obrigatórias, o excesso da carga tributária, os problemas trabalhistas e dos problemas com os fornecedores. Ainda há uma série de legislações que os Supermercados precisam observar, dentre elas se destaca o Código de Defesa do Consumidor.
Sobre o tema, vale salientar que o Procon é órgão legitimado para fiscalizar e lavrar auto de infração contra Supermercados, quando identificar alguma afronta aos direitos dos consumidores. Aqui em Mato Grosso do Sul não é diferente, basta um simples clique nas páginas eletrônicas do Procon Estadual de Mato Grosso do Sul e do Procon Municipal de Campo Grande, que encontraremos notícias acerca de empreendimentos comerciais que sofreram alguma fiscalização das respectivas autarquias.
Contudo, importante enfatizar, que mesmo havendo alguma irregularidade ao Código de Defesa do Consumidor, o Auto de Infração a ser lavrado pelo Procon (Estadual ou Municipal) deve respeitar o Art. 35, I do Decreto 2.181/97, que determina as informações que devem constar no auto de infração. Vejamos:
Art. 35. Os Autos de infração, de Apreensão e o Termo de Depósito deverão ser impressos, numerados em série e preenchidos de forma clara e precisa, sem entrelinhas, rasuras ou emendas, mencionando:
I – o Auto de Infração:
a) o local, a data e a hora da lavratura;
b) o nome, o endereço e a qualificação do autuado;
c) a descrição do fato ou do ato constitutivo da infração;
d) o dispositivo legal infringido;
e) a determinação da exigência e a intimação para cumpri-la ou impugná-la no prazo de dez dias;
e) a determinação da exigência e a intimação para cumpri-la ou impugná-la no prazo estabelecido no caput do art. 42;
f) a identificação do agente autuante, sua assinatura, a indicação do seu cargo ou função e o número de sua matrícula;
g) a designação do órgão julgador e o respectivo endereço;
h) a assinatura do autuado;
i) a cientificação do autuado para apresentar defesa no prazo estabelecido no caput do art. 42 e especificar as provas que pretende produzir, de modo a declinar, se for o caso, a qualificação completa de até três testemunhas, mediante fornecimento do motivo para o seu arrolamento e sempre que possível:
1. do nome;
2. da profissão;
3. do estado civil;
4. da idade;
5. do número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas;
6. do número de registro da identidade; e
7. do endereço completo da residência e do local de trabalho;
Assim, como é possível observar, há uma série de indicações que devem obrigatoriamente constar no documento, por essa razão é importante uma correta análise de todas as informações que constam no Auto de Infração recebido pelo Supermercado, pois a ausência de algum dos itens pode gerar a nulidade do AI.
Outro ponto que também deve ser observado, é se consta na notificação o prazo para apresentação de defesa do auto de infração, pois tal obrigação está expressa no Art. 42 também do Decreto 2.181/97. Vejamos:
Art. 42. A autoridade competente expedirá notificação ao infrator e fixará prazo de vinte dias, contado da data de seu recebimento pelo infrator, para apresentação de defesa, nos termos do disposto no art. 44.
§ 1º A notificação será acompanhada de cópia de ato de instauração do processo administrativo sancionador e, se for o caso, da nota técnica ou de outro ato que o fundamente por meio de remissão e será feita:
I – Por carta registrada ao representado, seu mandatário ou preposto, com aviso de recebimento;
II – Por outro meio, físico ou eletrônico, que assegure a certeza da ciência do representado; ou
III – por mecanismos de cooperação internacional.
Inclusive a ausência de notificação para apresentação de defesa administrativa, afronta os princípios do contraditório e ampla defesa, implicando na nulidade do processo administrativo do Procon e consequentemente da multa aplicada, conforme entendimento do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Vejamos:
Inclusive a ausência de notificação para apresentação de defesa administrativa, afronta os princípios do contraditório e ampla defesa, implicando na nulidade do processo administrativo do Procon e consequentemente da multa aplicada, conforme entendimento do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Vejamos:
RECURSO DE APELAÇÃO DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL – EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – MULTA APLICADA PELO PROCON/MS – NULIDADE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO POR AFRONTA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA – AUSÊNCIA DE PRÉVIA INTIMAÇÃO DA EMPRESA RECLAMADA QUANTO AO ALEGADO DESCUMPRIMENTO DE ACORDO FIRMADO NO PROCESSO ADMINISTRATIVO – RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. É nulo ato administrativo – consistente em aplicação de multa pelo PROCON – quando deixa de oportunizar o prévio exercício do contraditório e da ampla defesa da empresa reclamada no que tange à suposto descumprimento de acordo firmado na via administrativa, culminando com a respectiva invalidação dos respectivos atos decorrentes, tais como auto de infração, multa e certidão de dívida ativa.
(TJMS. Apelação Cível n. 0841780-78.2017.8.12.0001, Campo Grande, 2ª Câmara Cível, Relator (a): Des. Marco André Nogueira Hanson, j: 19/11/2019, p: 28/11/2019)
Claro, que os Supermercados sempre buscam o cumprimento das obrigações previstas pelo Código de Defesa do Consumidor. Contudo, no caso de eventual fato isolado que afronte o CDC, é importante que a multa aplicada pelo Procon, cause o menor impacto possível ao faturamento da loja.
Portanto, é de extrema importância a correta análise acerca da apresentação ou não do faturamento do Supermercado ao Procon.
Dessa forma, no momento do recebimento da notificação de apresentação de defesa administrativa, também devemos observar se foi concedido prazo para apresentação do faturamento do Supermercado. Pois, um dos fatores que deve ser analisado no momento da fixação da multa, é a condição econômica do infrator, conforme determina o Art. 28 do Decreto 2.181/97[1], assim, é a partir do respectivo faturamento que haverá o enquadramento do porte econômico do Supermercado.
Assim, buscando demonstrar a relevância da presente análise, vale mencionar que o valor atual do UFERMS é de R$ 47,20 (quarenta e sete reais e vinte centavos), conforme Resolução /SEFAZ nº 3.251 de 12 de julho de 2022[2].
Dessa forma, após a informação acima, vejamos como é calculada a PBI (pena base inicial) da multa a ser aplicada pelo Procon em caso de afronta ao CDC, conforme determina o Decreto Estadual nº 15.647 de 08 de abril de 2021:
[1] Art. 28. Observado o disposto no art. 24 pela autoridade competente e respeitados os parâmetros estabelecidos no parágrafo único do art. 57 da Lei nº 8.078, de 1990, a pena de multa fixada considerará:(…) IV – a condição econômica do infrator;[2]http://aacpdappls.net.ms.gov.br/appls/legislacao/serc/legato.nsf/e5c724b4c70cb1da04256b1f005348a8/e1436e7e88056d3e0425887f0046118d?OpenDocument
Art. 45. A PBI será fixada de acordo com o caso concreto, respeitando-se o disposto no art. 57 do Código de Defesa do Consumidor, segundo os critérios mínimos abaixo:
I – Profissional qualificado nos termos do parágrafo único do art. 966, do Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002): 50 UFERMS
II – Microempreendedor Individual (MEI): 35 UFERMS;
III – Microempresa (ME): 100 UFERMS;
IV – Empresa de Pequeno Porte (EPP): 150 UFERMS;
V – demais empresas: 200 UFERMS.
Portanto, ao analisar o que dispõem a legislação, conseguimos identificar que há uma grande relevância na classificação do porte econômico do Supermercado, pois como indicado acima, é a partir do enquadramento do porte da loja que teremos o valor da PBI (Pena Base Inicial), que será utilizada para o cálculo da multa. Assim, buscando elucidar as informações contidas nas legislações indicadas acima, segue abaixo gráfico indicativo do valor da PBI frente ao porte econômico da empresa:
Como é possível perceber, a correta análise da apresentação ou não do faturamento do Supermercado é importante para resguardar o faturamento da loja. Pois, se é possível classificar a loja como “Microempresa” ou “Empresa de Pequeno Porte” e ter uma PIB (Pena Base Inicial) no valor próximo de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), por qual razão a loja deve correr risco de ser classificada como “Demais Empresas” e ter a PIB (Pena Base Inicial) perto do valor de R$ 10.00,00 (dez mil reais)?
Destacamos, que os valores indicados acima, se referem a pena base inicial, assim, o valor ainda será multiplicado pela gravidade da infração, sendo aplicada as agravantes e atenuantes previstas na legislação. Assim, uma infração por divergência de preço entre gôndola e caixa, pode facilmente chegar a valores próximos a casa dos R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
Lembrando, que aqui estamos falando apenas de questões técnicas para auxiliar a minimizar o valor de eventual aplicação de multa pelo Procon. Assim, além das questões indicadas anteriormente, ainda é possível discutir a própria fundamentação do órgão ao justificar a suposta infração cometida pela loja e pleitear aplicações de atenuantes.
Dessa forma, diante de um setor onde a margem de lucro é extremamente reduzida, a correta análise do auto de infração e da notificação para apresentação de defesa administrativa, são fortes aliados para redução dos prejuízos provocados pelas multas aplicadas pelo Procon no faturamento dos Supermercados. Afinal, é de fácil compreensão que uma multa no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), certamente irá gerar um forte impacto negativo no faturamento da loja.
Portanto, indicamos acima, alguns benefícios de uma correta condução dos processos administrativos oriundos do Procon, como forma de minimizar os impactos gerados pelas multas no faturamento dos Supermercados. Dessa forma, importante contar com o auxílio de uma assessoria jurídica especializada, capaz de auxiliar a loja nos processos de análise e tomada de decisão junto aos processos administrativos e judiciais.
Escrito por Juan Lucas Fonseca Pinheiro, advogado especialista em Direito Público e Administrativo com foco em demandas estratégicas relacionadas a processos consumeristas e Sócio do Escritório Mascarenhas Barbosa Advogados.